Defesa por terra ou ar?
A aplicação de defensivos, como por exemplo, fungicidas para ferrugem da soja, deve ser feita aos primeiros sinais de ataque da doença, logo após a detecção obtida através de monitoramento. A partir daí, o tratamento deve ser executado o mais rapidamente possível, visando proteger toda a área no mais curto espaço de tempo. O método de aplicação deve ser escolhido em função das dimensões da área e da velocidade de tratamento dos equipamentos - próprios ou contratados - disponíveis.
Tanto aviões agrícolas como pulverizadores terrestres, desde que adequadamente regulados e operados, podem ser utilizados com sucesso na aplicação de fungicidas para o controle de doenças e pragas.
Aspectos da aplicação aérea
Referências sobre aplicação terrestre de fungicidas em soja são numerosas. Entretanto, infelizmente, os órgãos oficiais de pesquisa não têm realizado ensaios utilizando a aplicação aérea. As recomendações decorrem, em sua maioria, de trabalhos práticos, experiência dos produtores agrícolas e operadores de aviação agrícola ou recomendações dos fabricantes.
Os aviões podem aplicar fungicidas tanto empregando bicos hidráulicos -convencionais ou eletrostáticos - como atomizadores
Os fatores-chave da aplicação aérea de fungicidas são o diâmetro das gotas e o número de gotas por cm2. A tecnologia de aplicação, por sua vez, está intimamente relacionada às características do produto. Por exemplo, fungicidas com ação de contato requerem maior número de gotas/cm2 (50 ou mais) e grande penetração, para atingir a parte inferior das plantas. Gotas pequenas (200-250 micra, ou menores) são requeridas.
Os fungicidas sistêmicos são menos exigentes, podendo ser aplicados com menor número de gotas ( 20 a 30 gotas/cm2). Deve-se atentar, entretanto, que os fungicidas sistêmicos disponíveis embora possuam capacidade de movimentação e ação de profundidade, deslocam-se dentro da planta em apenas um sentido (de baixo para cima) e, portanto, uma boa penetração continua sendo requerida.
Outro aspecto importante é que a ferrugem, por exemplo, inicia geralmente na parte inferior da planta, devendo o tratamento de proteção visar principalmente os dois terços superiores da planta, os maiores responsáveis pelo enchimento dos grãos, e ainda não infectados.
Na aplicação aérea de fungicidas de contato, volumes de 25 a 40 litros /ha e gotas finas (em torno de 200 - 250 micra) são necessários para garantir suficiente número de gotas/cm2 e depósito na parte inferior da planta.
Com fungicidas sistêmicos os volumes podem ser menores (15 a 20 l/ha), mantendo o diâmetro de gota em torno de 200 - 250 micra, o que assegura ainda boa penetração e densidade de gotas suficiente, tendo em vista o modo de ação do produto.
Volumes ainda menores (10 litros/ha ou menos) podem ser aplicados. Porém, desde que empregando calda especialmente formulada, já que serão necessárias gotas ainda mais finas (150 micra ou menos), que podem sofrer evaporação e deriva. Formulações especiais (por exemplo formulação UBV) ou o uso de aditivos são essenciais neste caso. O uso de aditivos deve ser aprovado pelo fabricante do fungicida e visa reduzir a evaporação, ou aumentar o peso da gota, ou inibir a formação de gotas excessivamente finas. Mesmo assim, precauções devem ser tomadas com a deriva, pois gotas muito finas, protegidas da evaporação, podem “viajar” grandes distâncias.
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AÉREA X TERRESTRE
São sistemas de aplicação não excludentes. Pequenas áreas; áreas com muitos obstáculos ou muito irregulares; áreas em que a aplicação aérea não é permitida (como por exemplo as situadas a menos de 500 metros de povoações): nestas, a aplicação aérea se revela não adequada ou não utilizável economicamente e, então, o produtor pode - e deve - complementar o tratamento aéreo empregando equipamento terrestre.
Onde é viável, a aplicação aérea apresenta características interessantes:
Rapidez: É a qualidade mais evidente, sendo a maior responsável pela eficácia do tratamento. Mesmo com volumes de 30 a 40 l/ha, a rapidez do tratamento aéreo é insuperável, ultrapassando os 50 hectares/hora. Quando aplicando em volumes menores (15-20 l/ha), o rendimento pode atingir algo como 80 hectares/hora. Produtividades superiores a 100 ha/hora podem ser alcançadas com volumes abaixo de 10 l/ha (tudo dependendo do avião, distância e comprimento da lavoura etc).
O maior benefício é poder tratar grandes áreas no momento adequado. Detectada a doença em um setor, toda a lavoura pode ser tratada em pouco tempo, evitando a disseminação do fungo.
Com equipamentos terrestres a produtividade é bem mais baixa podendo alcançar em torno de 100-150 ha/dia, por unidade, com os modernos pulverizadores autopropelidos, de grande porte.
Uniformidade: como o avião aplica em velocidade praticamente constante e não sofre influência das condições do solo (umidade, irregularidades), a uniformidade é excelente. Melhor resultado pode ser ainda obtido se o avião estiver equipado com sistema DGPS e um sistema de controle automático de vazão a ele acoplado. Esta configuração permite compensar pequenas variações de velocidade do avião (devido à topografia ou direção do vento).
Nas aplicações terrestres a uniformidade pode ficar prejudicada pelas variações da velocidade do trator, da altura da barra, e por desvios da trajetória. A correção de tais problemas é possível pela utilização de acessórios (respectivamente o controlador automático de vazão, mecanismos hidráulicos de compensação e DGPS), porém a um custo elevado, nem sempre suportado pelo pulverizador empregado, principalmente os de menor porte, tracionados.
Operação em qualquer condição de solo: o avião não sofre a influência de condições adversas do solo, como alterações devido às chuvas ou irrigação. Isto se torna mais evidente em regiões com altas precipitações durante o ciclo da cultura. Tão logo cesse a chuva, os aviões podem iniciar o tratamento, não necessitando aguardar que o solo seque. Nas aplicações terrestres este é um dos fatores mais limitantes. Após chuvas intensas, ficam os tratores e pulverizadores impedidos de entrar na área, às vezes por vários dias, atrasando o tratamento. Isto, freqüentemente, faz com que os produtores, impossibilitados de utilizarem os pulverizadores, vão em busca de aviões para efetuar o tratamento, operação não planejada anteriormente. Em não tendo sido previamente agendado, às vezes não encontram aviões disponíveis, por estarem atendendo contratos prévios. Tudo isso atrasa a aplicação, causa prejuízos e, naturalmente, insatisfação.
Ausência de danos à cultura: O tratamento aéreo não causa prejuízos por danos diretos à cultura (“amassamento”) ou indiretos, como a compactação do solo.
Estimativas indicam que a redução de colheita devido a danos ocasionados pelo uso de equipamentos terrestres, no estádio de aplicação de fungicidas, pode chegar a até 5%, ou aproximadamente 2 sacas de soja por hectare. Sendo assim, existiria um benefício econômico direto, já que a aplicação aérea, em média, custa ao produtor cerca de 0,5 saca de soja / ha em baixo-volume de aplicação, não atingindo 1 saca/hectare em altos volumes.
Uma estimativa desta relação custo/benefício pode ser encontrada na página da Indústria Aeronáutiva Neiva (http://www.aeroneiva.com.br/). Os dados, atualizados para fevereiro de 2004, mostram que o custo da aplicação terrestre é de US$ 4,00 /hectare, enquanto o da aplicação aérea é de US$ 9,00 / hectare (serviço contratado). À primeira vista, o custo da aplicação aérea é muito mais elevado. No entanto, quando levada em consideração a perda por amassamento - zero na aplicação aérea e US$ 14,14 / hectare (1,1 saca), na aplicação terrestre - a situação inverte-se: a aplicação terrestre passa a custar US$ 18,14, o que representa um custo a mais de US$ 9,14 por hectare (0,65 saca).
Não disseminação da doença : por não entrar em contato com as plantas, o avião não contribui para a disseminação da doença, pois não transporta os esporos da ferrugem de uma parte afetada para outra ainda sadia
Na aplicação terrestre, um pulverizador pode estar contribuindo para o alastramento da doença de uma área infectada para o restante da lavoura, ao levar esporos de uma para outra.
Maior concentração de produto: por resultarem de volumes de aplicação muito mais baixos que nas aplicações convencionais, as gotas, na aplicação aérea, contém maior concentração de princípio ativo, o que as torna mais eficazes e reduz a possibilidade de degradação ou desativação do produto por impurezas contidas na água, em especial sais, argila e matéria orgânica.
Enquanto na aplicação aérea os volumes máximos são de 40 l/ha, na aplicação terrestre os volumes mínimos são de 150 l/ha, ou seja, há quatro vezes mais água, sais e impurezas para reagir com o produto, neste tipo de aplicação e, ainda, muito mais tempo de contato.
Outras características vantajosas: a participação de pessoal especializado (piloto agrícola, técnico executor em aviação agrícola, Engenheiro Agrônomo como Responsável Técnico e, ainda, uma completa regulamentação e fiscalização da atividade fazem da aviação agrícola uma ferramenta segura para a aplicação de defensivos agrícolas, inclusive fungicidas para o controle de doenças da soja.
Este é outro ponto importante de diferenciação, já que para a aplicação de defensivos com equipamentos terrestres não é exigida nenhuma habilitação do aplicador. Também não existem dispositivos legais específicos que regulamentem este tipo de aplicação, o que seria altamente desejável para a maior qualificação das aplicações convencionais.
Pontos positivos
Do ponto de vista técnico, uma qualidade positiva da aplicação terrestre é o maior controle sobre a área em tratamento: mesmo diminutas porções no interior da área principal podem ser deixadas sem tratar, se assim for desejado. Também nas bordas da área em tratamento, a aplicação terrestre consegue uma definição mais precisa entre a área tratada e a não tratada.
• Um outro ponto destacado pelos produtores está relacionado à disponibilidade: tendo um - ou mais - pulverizadores na propriedade, o produtor tem maior poder de decisão sobre quando iniciar e interromper o tratamento (o que, no caso das aplicações aéreas, pode e deve ser contornado por contratos de prestação de serviços bem feitos e com antecedência).
• Do ponto de vista financeiro, a vantagem da aplicação convencional está no menor desembolso de recursos financeiros à época do tratamento. De fato, o avião contratado deve ser pago (à razão de “x” R$ por hectare), enquanto que, se a aplicação for executada com equipamentos terrestres próprios, o desembolso do produtor naquele momento é praticamente restrito ao combustível e salário do operador, pois o restante do custo é diluído ao longo do tempo. Esta vantagem financeira, no entanto, geralmente não se traduz em vantagem “econômica” e nem em vantagem no cômputo custo/benefício final, conforme mostrado anteriormente.
Efetuando um balanço das vantagens e limitações de cada um dos métodos de aplicação, confirma-se a característica de complementação entre eles. Atuando de forma inteligente, o produtor pode valer-se dos dois métodos, em benefício de um controle mais eficaz das doenças da Soja, em especial a temível “Ferrugem Asiática”.
Eduardo C. de Araújo,
Agrotec Tecnologia Agrícola e Ind.
* Este artigo foi publicado na edição número 28 da revista Cultivar Máquinas, de março de 2004.
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